Wednesday, November 14, 2007

Uma Mulher Caminhando o Outono...


Eu estava sentado a olhar o cair do Outono. Era sozinho ali no embalar das folhas castanhas e ela também, sempre que passava, sempre sozinha. E eu já sonhava com ela, sonhava sozinho sem sonhar, era real, o seu caminhar apressado era real e eu era ainda um miúdo, um miúdo pequeno parado a olhar. E sonhava não com ela mas com a vida que eu lhe conhecia e que para ela não existia.



Trazia o Outono com ela, o entardecer triste de uma alegria afogada em melancolia. Nunca sorria e eu não lhe sabia assim, era a pressa dos cabelos loiros que lutavam contra o vento que anuncia a noite fria do tudo a gelar. E em gelo se transformava aquela face branca, branca de neve e gelo que não deixa expressar. Tento-lhe advinhar o caminho, o seu destino e o seu começar, a noite passada, sempre mais fria que o dia.



E ela aí sem sozinha ser, cheia de mais, cheia das pessoas, cheia dos outros e tão cheia de nada. Estava vazia, vestida de um lindo de morrer e a sorrir, mas eu sabia, nada tinha para sorrir, não sentia, consumida de frio, de lágrimas sem correr e o Inverno vivo lá dentro, nesta mulher para quem o Outono era já o fim.



E depois parabéns e mais e mais vozes e sempre os parabéns. Parabéns Anne Marie, tocaste hoje, tocaste no teu violino e nada conseguiste sentir, nada havia, nada havia a sentir. O rio que corria aqui dentro e que se soltava em cascata a chorar, cascata a tocar, esse rio, perdera a força. Ela ouvia, ia ouvindo o fluir desses parabéns e sabia, eram vazios, vazios como ela.



E ela andava apressada, passava por mim como já antes havia passado e nem olhava. Só lhe interessava a dor que não sabia. Voltar a sair do seu eu, ultrapassar o corpo e chegar ao seu violino, violino que era ela.



E procurava a casa dele que também era ela, ele que tão bem lhe fazia, conhecia. Ele que nela se tornara tanto e a consumia gelando, parando o tudo pois só ele era tudo e o seu fogo, o seu arder, a faísca que o amor neles incendiava era fria também. Fria no abandonar do calor quando a noite o amor divide, gelada despedida, o adeus do não unir. Eram dois, nunca um, nessa madrugada de Inverno. E a casa dele, a casa que sempre abandonava ali parada à espera. Recebia-a na incerteza.



Não consigo assim, não consigo este Verão abandonar, o Verão do teu calor que eu tanto amo. Sabes, lá fora é tudo frio e gelo que doi sem me deixar chorar, sem ser possível tocar.



E ele sem conseguir entender, sem conseguir desvendar aquela mulher que achava amar sem saber. Não havia a palavra, não havia o diálogo, nada no seu dizer e as mãos dela, mãos do frio da neve que a envolvia, mãos o violino envolvendo, violino a soltar o sussurro e ele a ouvir o amor. O amo-te sozinha e és tanto para mim e esse coração que enche e transborda, o calor, o vapor desse gelo nela sem já ser, o derreter, o Verão no Outono, tão mais perto que esse Inverno de noite e a noite já sem existir, só dia e Sol, Sol que derretia nas mãos essa estátua de gelo, esse gelo agora degelo a acabar, em mar de ondas de amor e ele a olhar quando ela cansada, estafada conseguiu acabar numa lágrima. A primeira delas que o reflectia em tão quente saber, porque agora ele sabia.

Ass: Francisco

1 comment:

Francisco said...

É sempre um prazer poder ler-me num blog amigo e tal, principalmente um onde também se escrevem umas boas cenas e coisas! abraço