Wednesday, August 29, 2007

A nossa geração


Sempre foi, para mim, um conceito algo estranho, a roçar o indeterminado. Afinal, o que é uma geração?

Um mero conjunto de pessoas com idades próximas? Um movimento mais ou menos assumido e consciente de representantes políticos e cívicos dessa mesma geração que defendem valores comuns perante a sociedade? Ou, até, um conjunto de pessoas marcadas por determinado acontecimento histórico?

Certamente um pouco de tudo isto.

Grosso modo, os nossos avós (e bisavós) serão a geração Estado-Novo, os nossos pais a geração guerra colonial/25 de Abril, nós a geração União Europeia e os putos... enfim... os putos ficarão a geração Britney Spears... Não? 50 Cent então... Também não? Epá... Então Bataton. E não se fala mais nisso.

Tudo isto a propósito de uma música que me anda no ouvido, escrita e cantada por um cancioneiro Português de quem gosto muito. JP Simões de seu nome (artístico, como convém).

Deixo-vos a definição que faz da sua própria geração. Resta saber como definiremos a nossa daqui a uns anos. Eu cá arrisco dizer que não andará longe da dele.

Ou não vivêssemos todos nós, cada vez mais, em função apenas de, e para, nós próprios.

A minha geração já se calou, já se perdeu, já amuou,
já se cansou, desapareceu ou então casou, ou então mudou,
ou então morreu: já se acabou.

A minha geração de hedonistas e de ateus, de anti-clubistas,
de anarquistas, deprimidos e de artistas, e de autistas
estatelou-se docemente contra o céu.

A minha geração ironizou o coração, alimentou a confusão,
brincou às mil revoluções amando gestos e protestos e canções,
pelo seu estilo controverso.

A minha geração só se comove com excessos, com hecatombes,
com acessos de bruta cólera, de mortes, de misérias, de mentiras,
de reflexos da sua funda castração.

A minha geração é a herdeira do silêncio, dos grandes paizinhos do céu,
da indecência, do abuso, e um belo dia esqueceu tudo e fez-se à vida
na cegueira do comércio.

A minha geração é toda a minha solidão, é flor de ausência, sonho vão,
aparição, presságio, fogo de artifício, toda vício, toda boca
e pouca coisa na mão.

Vai minha geração, ergue a cabeça e solta os teus filhos no esplendor do lixo e do descuido, deixa-te ir enquanto o sabor acre da desistência
vai corroendo a doçura da sua infância.

Vai minha geração, reage, diz que não é nada assim, que é um lamentável engano,
erro tipográfico, estatística imprecisa, puro preconceito,
que o teu único defeito é ter demasiadas qualidades e tropeçar nelas.

Vai minha geração, explica bem alto a toda a gente que és por demais inteligente
para sujar as mãos neste velho processo, triste traste de Deus,
de fingir que o nosso destino é ser um bocadinho melhores do que antes.

Vai minha geração, nasceste cansada, mimada, doente por tudo e por nada,
com medo de ser inventada,
o que é que te falta agora que não te falta nada?
Mas, minha geração, valeu a trapaça, até teve graça,
tanta conversa, tanta utopia tonta, tanto copo,
e a comida estava óptima! O que vamos fazer?

9 comments:

Juíz Implacável said...

Meu caro amigo Eddie Felson,
dá-me sinceramente a impressão que o meu amigo se encontra um pouco perdido! Logo se me permite ajudá-lo creio que você pertence à geração Samantha Fox, e sabe porquê? Eu explico, é que ela tinha duas GERAÇÕES que faziam qualquer um ficar perdido...
Abraço

Anonymous said...

O que vamos fazer?

É a pergunta... A já quem tenha dado a resposta... - Chular os Portugueses, essa rapaziada com memória curta, que diz mal... e pouco faz...
Não é por acaso que um terço da população portuguesa está emigrada...

É tempo de passar a acção, palavras levas o vento, e os sacanas a encherem os bolsos

Anonymous said...

Passem as gerações que passarem, a "nossa" tem sempre a criticar na que nos segue a libertinagem e a leviandade... no fundo é pena de não termos sido "mais a frente"!

Nuno Raimundo said...

Bonito post.
Pertinente e actual!


abr...prof...

Isabel said...

Não conhecia o artista, também gostei muito da mensagem.

Eddie Felson said...

Caro Juiz,

Se fossemos por aí, penso que a geração dos nossos pais teria mais sorte:

Geração Raquel Welsh.

CHEVALIER DE PAS said...

Um comentário subliminar!

Agora que temos tudo e não nos falta nada... falta quem nos conduza...à "nossa" geração!

O que fazer?
AMAR

D.P.V said...

Estamos todos no mesmo my friend, quem e que se senta ao volante? Ao menos sabemos aonde nao queremos ir.

Tiago Pestana de Vasconcelos said...

Grande Eddie!

Pois é, tou de férias mas não pude deixar de ler, e reler, este post. Gostei muito, algo nostálgico mas bonito...

Esta coisa das gerações tem muito que se lhe diga, tenho amigos de 40 anos que são da minha geração, e às vezes sinto que tenho amigos de 40 anos que estão na geração abaixo da minha...

Acho que cada um faz a sua idade, cada um faz a sua geração... só temos de ter cuidado para não as passarmos per saltum que isso pode ser perigoso..

Mantenho-me de férias, mas vou andando por aqui..

Abraço!